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PINTURA

SABIAS QUE AS PAREDES TÊM OUVIDOS | 2012

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MURMÚRIOS DE MUROS

As meninas nunca deviam ser fechadas a sete chaves. Os sonhos nascem da carência. O príncipe encantado é um fantasma gerado pela falta de amor. As paredes transpiram desejo de liberdade. Mas o paradoxo do prisioneiro, descrito por Kafka, é inevitável: se, por um lado, a vontade do recluso está toda voltada para um único ponto de fuga – ou antes, de evasão – que orienta a perspectiva global, por outro, é preciso sobreviver à clausura e, para tanto, tornar a cela confortável ou, pelo menos, habitável. Forrar as paredes, decorá-las, grafitá-las. Ora, a liberdade é sempre condicional, condicionada. O horizonte está sempre tapado por paredes. Se o interior é, por essência, uma jaula, o exterior é um labirinto. E o dentro só se distingue do fora pelo tecto, não pelas paredes. E pelos respectivos ocupantes. Dentro, está-se em casa. Fora, circulam minotauros e caçadores de minotauros, e meninas amedrontadas, sacrificadas aos monstros. E talvez outras criaturas, tímidas ou envergonhadas, que inscreveram nas paredes a sua fome ou a sua profusão de amor, criaturas enclausuradas que sofrem de idênticas privações e em quem a prisioneira, sem as ver, reconhece as suas semelhantes, as suas irmãs. Uma solução consistiria em interiorizar as paredes da cidade, com os seus azulejos, os seus cartazes arrancados e os seus graffitis, com os seus contos, as suas promessas, os seus gritos – pois as paredes são faladoras para quem sabe escutá-las –, em transportá-las para dentro de casa, em pendurá-las como um correr de janelas tapadas nas paredes interiores da cela mental, em responder ao apelo que elas lançam. Porque a liberdade fica sempre do outro lado. Do lado de cá, há os dias contados, as declarações riscadas, as lágrimas contidas, os encontros falhados, os recados rasgados, os desejos emparedados, o pesar dos arrependimentos. F

Saguenail

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